Psicoterapia Corporal, o que é?

Psicoterapia Corporal é uma designação que abrange um leque variado de modelos psicoterapêuticos, cuja base comum é o papel estruturante atribuído ao corpo no decorrer do processo terapêutico.

“Uma primeira forma de caracterizar a psicoterapia corporal é associá-la a todas as formas de psicoterapias que utilizam técnicas físicas explícitas para fortalecer o diálogo entre paciente e psicoterapeuta” (Heller, 2008).

A diversidade de modelos de intervenção em Psicoterapia Corporal – como noutras abordagens – encontra a sua origem na tendência que se começa a desenvolver no Séc. XXI, de compreender o indíviduo de forma holística, em oposição ao paradigma dualista vigente. Esta tendência viria a produzir impacto no espaço terapêutico, espaço no qual o psicólogo recebe agora o indíviduo em toda a extensão da sua complexidade, corpo incluído.
O crescimento, desde o início do Sec. XXI, da perspectiva relacional em psicoterapia e o avanço generalizado da investigação em neurociências abriram novos caminhos de intervenção e compreensão em psicoterapia, que se estenderam para a vertente corporal, fortalecendo-a e aumentando o número de profissionais que a ela recorrem (Soth, 2005).

A psicoterapia corporal disponibiliza uma sustentação teórica para o funcionamento entre mente e corpo, contemplando a complexidade desta interacção, sem no entanto esquecer a influência do meio no indivíduo.

“A era Cartesiana que separava corpo e mente entrou finalmente em mudança, é agora absolutamente necessário integrar pensamento, emoção e acção. Harmonia na vida é a dança adequada entre o que penso, sinto e faço” (Boadella, 1988).

O início da integração do corpo em psicoterapia acontece com Wilhelm Reich, díscipulo de Freud, que a partir do seu próprio processo terapêutico e das dificuldades e necessidades sentidas nele, introduz no processo psicoterapêutico a observação do corpo e da respiração – elementos centrais – bem como a atenção às expressões da cara, à qualidade da voz e aos padrões corporais. Tal como Freud tinha identificado uma divisão entre memória consciente e inconsciente, Reich viria a identificar uma divisão entre expressões do corpo; uma pessoa pode sorrir mas não estar consciente da expressão de tristeza que o rosto mostra. Pode, também, expressar verbalmente palavras simpáticas sem perceber que usa um tom de ressentimento, expresso também pelo olhar ou que o seu maxilar está tenso e fixado numa expressão de desprezo. Ou seja, a subjectividade do indivíduo manifestava-se de duas formas: verbal e não verbal. A expressão não verbal encontra-se no corpo (Weil; Tompakow, 1973).

Qualquer coisa que aumente, diminua limite ou amplie o poder de ação do corpo, vai aumentar diminuir, limitar ou ampliar o poder de ação da mente. E qualquer coisa que aumente, diminua limite ou amplie o poder de ação da mente, vai aumentar diminuir, limitar ou ampliar o poder de ação do corpo.” (Spinoza,1632-1677).

A valorização da expressão não verbal não é exclusiva de Reich, no entanto, Reich construiu um universo teórico e conceptual baseado nela, sendo particularmente inovador ao mapear as regiões do corpo humano, relacionando-as com as emoções. Paralelamente, introduziu a ideia que situações traumáticas e experiências de vida também se instalam e manifestam corporalmente e que o corpo é ele próprio, também, responsável pelo bloqueio de emoções conflituosas. O corpo era, assim, visto como um documento físico da história de vida do indivíduo, o qual continha as suas memórias de experiências traumáticas mais precoces, as suas crenças, atitudes e estratégias – psicológicas, comportamentais e físicas – desenvolvidas como resposta.
Reich, deixou um legado de seguidores que dariam início a uma segunda geração de psicoterapeutas influenciados pelo seu trabalho e pesquisas, que viriam a ser apelidados de Neo-Reichianos, desenvolvendo hoje um trabalho terapêutico mundialmente reconhecido (Tonella, 2000). Várias técnicas de intervenção corporal nasceram com o trabalho de Reich, algumas delas derivando em vertentes psicoterapêuticas importantes, hoje utilizadas mundialmente, como é caso da Vegetoterapia, da Analíse Bioenergética, da Biossintese e a Biodinâmica, entre outras.

A Psicoterapia Corporal é hoje uma técnica mundialmente difundida e são cada vez mais os defensores da integração do corpo em terapia, com vista a um trabalho psicoterapêutico completo e eficaz. Mesmo terapeutas que não recorrem necessariamente a trabalho físico, optam por técnicas de respiração e consciência corporal que permitem uma maior consciência de si e dos processos internos do indivíduo.
Um psicoterapeuta corporal recorre a técnicas diferentes das utilizadas por um psicoterapeuta que apenas use a expressão verbal, no entanto, aplica também todas as restantes técnicas habitualmente usadas, já que essas técnicas não colidem com o trabalho centrado no corpo, completando-o. O psicoterapeuta corporal fala naturalmente com os seus clientes, explora os seus processos, centra-se na relação terapêutica e tenta ajudá-los a dar significado às suas experiências (Totton, 2003).

Actualmente, a Associação Americana de Psicoterapia Corporal ( United States Association for Body Psychoterapy – USABP) em conjunto com a Associação Europeia de Psicoterapia Corporal (European Association for Body Psychoterapy – EABP) continuam a desenvolver investigação no sentido de recolher mais dados sobre a prática e resultados terapêuticos da Psicoterapia Corporal.

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